Se há um fenômeno que me fascina e aborrece simultaneamente é a capacidade dos alemães em falar um mesmo tema horas a fio. Como já afirmou Caetano Veloso na sua canção “Língua: está provado que só é possível filosofar em alemão”, pois eles realmente filosofam sobre qualquer assunto cotidiano. Eis a minha experiência.
No intuito de fazer novas amizades, aceitei o convite da mãe de uma amiguinha da minha filha para sair. O grupo era o seguinte: tres alemãs e eu. Uma delas, a Carola (sim, isso é um nome próprio aqui) era a figura central, pois é amiga das outras duas alemãs, que por sua vez, eram apenas conhecidas. Eu era a novata. A programação era ir a uma feirinha de quinquilharias; esses briques de coisas usadas, que, não é exatamente a minha praia, mas em prol do círculo social, encarei a parada; e depois ir a um bar/restaurante tomar algo.
Pois bem, terminada a feirinha, nos dirigimos ao restaurante que havia ali ao lado, sentamo-nos e começamos a conversar. A Carola foi quem tomou a palavra e começou a reclamar da escola onde leciona, contando um episódio desagradável que aconteceu entre ela e o diretor.
Vocês acreditam que esse tema, ao meu ver, completamente aborrecedor, evoluiu e tornou-se a conversa do encontro durante a uma hora e meia que estivemos ali sentadas? Pois sim, da reclamação o papo passou para como reagir à grosseria do chefe, daí a como funciona a escola e os problemas que os outros funcionários e professores têm, passando para como trocar de escola dentro do estado da Bavaria, e acabando na explicação dos pormenores da hierarquia e burocracia do sistema educacional desse estado alemão.
E as outras duas alemãs ficaram o tempo todo concentradissimas no assunto, fazendo perguntas e completamente interessadas no tema.
Depois de uma hora de conversa, finalmente a Carola recostou-se na cadeira e disse: “na verdade estou cansada de falar sobre isso, já me basta a rotina, queria conseguir esquecer o assunto” então, ela olhou para mim e disse: “e você, o que faz?”. Consegui responder “sou brasileira e fiz direito”.
Nesse exato momento aparece o garçon e nos comunica que o restaurante está fechando, pedindo gentilmente a nossa saída. Então pensei: salva pelo gongo, pois se eu tivesse que contar minha história, certamente não sairíamos do tópico “porque você não quer mais trabalhar como advogada!”
E haja argumentos para sustentar a discussão!
Larissa d’Avila da Costa, Gilching novembro 2016.