Memórias

Estou de férias no Brasil, na minha terra Natal, uma pequena cidade do Rio Grande do Sul na Serra Gaúcha. Há mais de 25 anos que não moro aqui. Conheço as pessoas mais pelo o que minha família me conta delas, do que minha própria memória ou interesse.

Cumprimento muita gente na rua por simpatia, muitas vezes sem saber quem são, dependendo sempre da ajuda da minha mãe ou meu irmão para recuperar a lembrança.

Pois eis que, em um dia de calor, acompanhando minha mãe, meus filhos e marido num passeio pela praça da cidade, meu filho pediu um sorvete e apontou uma sorveteira do outro lado da rua.

Fui lá com ele e minha mãe comprar sorvete para todos. Um rapaz bonito, bem educado nos atendeu com muita gentileza. No final do pedido, antes de pagar, ele me olha no fundo dos meus olhos e pergunta:

– Tu não é a Larissa?
– Sou sim.
– Nós fomos colegas de colégio.

Eu fiquei com uma cara de ponto de interrogação. Não me lembrava em absoluto quem poderia ser aquele rapaz e em que período da minha vida escolar eu poderia ter sido colega dele. Continuo olhando-o e tentando fazer com que a memória ajude. Diante do meu silêncio, ele diz:

– Fomos colegas na sexta série.
Nada.
– Nossa, você tem memória boa, hein? -disse eu, tentando ganhar tempo. Nada ainda. Nenhuma lembrança. Tento repassar mentalmente meus colegas da sexta série. Isso foi há mais de trinta anos! Nada. Constrangida, digo:

– Desculpe, mas eu não estou lembrando de ti. Qual é o teu nome mesmo?

Ele responde e parece muito decepcionado quando, ainda assim, a memória traiçoeira falha.

Os sorvetes para o meu marido e filha começam a derreter na minha mão. Meu filho me indaga o que estou conversando e no meio dessa atrapalhação, totalmente desconcertada, me despeço e saio da sorveteria.

Fico pensando no acontecido. Na sexta série eu tinha 12 anos, e me achava a pessoa mais feia e insignificante da face da terra. Sentimento normal entre os pré-adolescentes. Jamais na minha vida imaginaria que pudesse ter marcado a memória de algum rapaz da escola.

Um sentimento misto de lisonja, pena do rapaz por não retribuir a lembrança e a certeza de que essa fase da adolescência é realmente cruel com a nossa essência insegura.

Larissa d’Avila da Costa – Vacaria, março 2017