Sensação, segundo o dicionário é uma impressão física recebida pelos sentidos, como calor e frio. É ainda a condição mental ou emocional produzida pela impressão de um órgão do sentido, como apreensão, angústia e prazer. Por isso sensações são muito difícies de serem descritas, pois é um sentimento, e cada um tem suas próprias percepções.
Podemos dizer que sensações podem ser compartilhadas, quando sabemos do que o outro está falando, a que está se referindo, pois já sentimos algo semelhante. A tentativa de descrever uma sensação pode ou não ser compreendida pelo interlocutor, dependendo das experiências que este vivenciou.
Uma mulher que nunca teve um filho não poderá jamais entender a sensação de carregar um no ventre e saber o que tudo isso significa. Um empresário não poderá descrever jamais a sensação de poder e de sucesso alcançada no fechamento de um grande negócio a alguém que nunca teve tal ambição.
Sentimentos negativos ou dolorosos como uma perda, vazio, frustação, impotência, agústia geralmente são mais difíceis de serem descritos e compartilhados, pois suas causas diferem muito de uma pessoa para outra.
Sensações de prazer, de euforia, de alegria são, por seu lado, mais facilmente percebidos e compatilhados por outras pessoas, pois exalam energia e contagiam o bom humor e alegria.
A sensação da qual eu quero falar, porém, só pode ser entendida e compartilhada por aqueles que moram no hemisfério norte do planeta e possuem estações do ano bem definidas. É a chegada da primavera.
Para a grande maioria dos brasileiros, primavera é uma estação intermediária que praticamente não existe. Mesmo no sul do Brasil, onde existe diferença entre as estações do ano, a primavera não possui, nem de longe, o mesmo significado nem produz as mesmas sensações que a chegada da primavera traz aos habitantes dessa parte do planeta.
Para que eu possa descrever melhor esse sentimento, há que explicar primeiro como é o inverno, para que os contrastes sejam bem definidos.
O inverno na Alemanha começa devagarinho no final de outubro. Os dias vão ficando cada vez mais curtos, pois anoitece cada vez mais cedo. As folhas das árvores já começaram a cair, e, lentamente não se vê mais verde. Os passarinhos voam em debandada para lugares mais quentes e de repente não se ouve mais o seu canto na rua. Os dias são chuvosos e nublados. Podem passar-se semanas sem que apareça o sol, o frio é úmido e constante. As pessoas na rua andam apressadas, enfiadas nos seus casados escuros. Elas não trocam olhares, só querem chegar rapidamente aos seus destinos, provavelmente um lugar quente. Já no meio de dezembro, cinco da tarde já está escuro, e seis da tarde todos já estão recolhidos nos seus lares e há pouquíssima gente na rua. Aqui começa-se a trabalhar cedo, para aproveitar-se mais a luz do dia. O silêncio no inverno é glacial. Não se ouve o canto dos passarinhos, não se ouve latidos de cachorros, nem miados de gatos, nem qualquer outro ser vivo, pois qualquer tipo de animal, seja cachorro ou vaca estão todos em lugares quentes e cobertos. O inverno dura até a segunda metade de março, mais ou menos.
Aí então, chega lentamente a primavera. Ela chega muito devagar e tímida. Traz consigo um turbilhão de temperaturas diferentes. Primeiro dá o seu ar da graça com dias ensolarados e quentes, depois, sem avisar nada, passa para dias chuvosos e frios e assim vai mudando o tempo como lhe dá vontade. Ela transforma toda a paisagem. Com ela voltam os passarinhos e ouvimos novamente o seu canto. As árvores começam a brotar sem pressa. O verde das folhas é uma cor quase indescritível. Não é somente verde, é um verde vivíssimo, exuberante, cheio de energia, como se estivesse trazendo dentro de si toda a vontade de viver que possui, como que se estivesse mostrando, sim eu estou viva e me alegro por isso. As cerejeiras florescem com suas flores rosadas, contrastando com o caule e os galhos ainda desnudos, num misto de cores de marrom, rosa e branco.
As sensações que tudo isso proporciona, só entende quem vive desse lado do hemisfério. Não tem como explicar. É uma alegria pelo renascimento da natureza. É uma sensação de liberdade, por podermos desenclausurar. É um sentimento de esperança, de um novo começo, de mudança de ares, do fim do mau humor, de dias mais longos, de poder estar na rua sem sentir frio, de desfrutar do sol.
Desfrutar do sol e do calor. Isso é uma coisa que passa-se a dar muito valor quando se vive por aqui. Os alemães, por seu lado, não conseguem entender que, para nós brasileiros, isso é uma coisa tão normal que não desfrutamos, não apreciamos, simplesmente o sol está lá, como sempre, todos os dias (ou quase), e, quando eu conto que quando morava no Brasil às vezes desejava uns diazinhos nublados, com chuva e um friozinho, ele me olham com um olhar incrédulo e comentam no seu tom mais do que típico: “jetzt hast du genug davon” – “agora você tem isso o suficiente”. É, definitivamente…
Larissa d’Avila da Costa
Mannheim, abril 2008.